A Cidade Industrial Juventino Dias foi instituída pelo Decreto 770 de 1941, assinado pelo governador Benedito Valadares, se tornando o primeiro distrito industrial planejado da América Latina. Valadares também ficaria conhecido pela construção da primeira usina hidrelétrica de Minas Gerais, a de Gafanhoto, no rio Pará. Em Contagem, o empreendimento foi marcado pelos laços de solidariedade dos operários que trabalhavam nas fábricas e viviam no entorno delas, na luta por condições mais dignas de trabalho e moradia. É o que mostra a terceira reportagem da série “Contagem vista de cima”.
O parque industrial viveu um processo de expansão e depois experimentou o inverso, a retração. Paralelo a isso, surgiram problemas de planejamento e os efeitos indesejáveis da poluição proveniente da industrialização, contrastando com a luta a favor do meio ambiente. O planejamento da Cidade Industrial ficou a cargo de órgãos estaduais.
Na época, com o país vivendo a ditadura Getulista, Benedito Valadares foi nomeado interventor do Estado de Minas Gerais e nomeou Juscelino Kubitschek prefeito de Belo Horizonte. Os dois idealizaram a construção de um parque industrial próximo à capital mineira, e não dentro dela, como estratégia para afastar os problemas oriundos das atividades.
Benedito Valadares convidou o secretário de Estado de Agricultura, Obras Públicas, Indústria e Viação, Israel Pinheiro, que depois assumiu a Superintendência da então estatal Companhia Vale do Rio Doce, criada por Getúlio Vargas, para construir o parque industrial. Após pesquisas sobre complexos industriais mundo afora, Israel Pinheiro apresentou projeto inspirado no traçado de Camberra, a capital planejada da Austrália.
[caption id="attachment_32745" align="aligncenter" width="700"] Sem a trincheira, a praça da Cemig na década de 70 (Foto: Elias Ramos/Reprodução - 10/8/2016)[/caption]O traçado constituía-se de um hexágono e ruas adjacentes em um de seus lados, no canto direito. Sessenta anos depois, a Cidade Industrial e sua planta original se tornaram bens inventariados para fins de proteção dos órgãos públicos, com a promulgação da Lei Municipal nº 4.647 de 2013.
Primeiras empresas
A primeira empresa a chegar à Cidade Industrial foi a Companhia de Cimento Portland Itaú. Depois vieram a Magnesita, o laboratório Osório de Moraes, a Estamparia S.A. e a Companhia de Tecidos Santa Elizabeth, dentre outras. Elas receberam incentivos econômicos para se instalar em Contagem.
O projeto previa a setorização para instalação das indústrias. E para abastecer o parque industrial de energia elétrica foi construída a usina de Gafanhoto, em Divinópolis, Centro-Oeste de Minas. Foi a primeira usina da Cemig, criada por Juscelino Kubitschek quando ele assumiu o governo de Minas, em 1951.
[caption id="attachment_32746" align="aligncenter" width="700"] Avenida Cardeal Eugênio Pacelli é uma das principais vias da região (Foto: Milton Rocha - 21/1/2006)[/caption]Para que os funcionários das indústrias pudessem residir perto delas foram construídas moradias operárias, como as vilas Itaú, Magnesita e Santa Elizabeth. Como nem todos tinham acesso a esses locais, foram se formando aglomerados em torno das empresas, sem nenhuma infraestrutura e comércio incipiente. Ao mesmo tempo, fazendas no entorno foram loteadas. A expansão dos bairros e vilas operárias não obedeceu a concepção do projeto e eles foram se formando por meio de mutirões. As ruas e o saneamento básico foram viabilizados mediante forte pressão popular.
Greve operária
Com uma população predominantemente de operários, a região foi palco de importantes lutas nacionais de trabalhadores. Há 51 anos, em abril de 1968, ano de muitas inquietações políticas, cerca de 1,6 mil funcionários da Belgo Mineira, fábrica instalada na Cidade Industrial, cruzaram os braços pleiteando reajustes salariais. Foi a primeira greve registrada no país depois da instauração do regime militar, que desde 1964 impunha a política de arrocho salarial.
Na década de 70, a questão ecológica entra na agenda pública com o combate à poluição do ar na Cidade Industrial. A partir de 1975, os impasses entre as empresas potencialmente poluidoras e a Prefeitura de Contagem se acentuaram. Em jornais da época, inclusive publicados fora do Estado, era possível acompanhar o debate, com a divulgação de que o prazo dado pelo Município para a instalação de filtros nas chaminés das fábricas seria encerrado no fim de junho de 1975.
[caption id="attachment_32747" align="aligncenter" width="700"] A estação do metrô é um dos componentes de mobilidade do polo industrial (Foto: Elias Ramos - 21/8/2010)[/caption]Na edição de “O Estado de S. Paulo” de 6 de agosto de 1975 foi publicada reportagem afirmando que “100 mil habitantes dos bairros Eldorado, Santa Cruz Industrial, JK, Glória e Novo Eldorado foram os principais responsáveis pela luta contra a poluição”. Sacos cheios de pó de cimento eram recolhidos pelas donas de casa nos alpendres, quintais e telhados das residências. Ação judicial de cunho popular foi encaminhada ao Fórum de Contagem. O governo federal tomou para si a responsabilidade. O impasse ganhou tanta notoriedade que o Dia Nacional de Combate à Poluição é comemorado em 14 de agosto.
Expansão
De acordo com a reportagem do “Estadão”, 54 mil operários trabalhavam em Contagem em meados da década de 70. Havia mais de 120 fábricas funcionando. O processo de expansão industrial foi contínuo, principalmente entre as décadas de 40 e 50. Muitas pessoas que vivem atualmente na região têm algum parente que fez parte da primeira fase de industrialização, os primeiros trabalhadores da Cidade Industrial.
Hoje, os limites da Cidade industrial se confundem com os de Belo Horizonte. No local predominam os galpões, constituindo-se como um importante acervo de patrimônio industrial. Entre símbolos da região se destacam as chaminés e prédio administrativo da Companhia de Cimento Portland Itaú, o hexágono, a capela de São José Operário, a Praça dos Trabalhadores, a pedreira Santa Rita, o pomar das mangueiras da fazenda de Filemon de Mattos, o Centro de Memória do Trabalhador da Indústria, a feira do bairro Amazonas e o tradicional Encontro de Folia de Reis do Jardim Industrial.
[caption id="attachment_32748" align="aligncenter" width="700"] A avenida Amazonas é outro importante corredor de trânsito que corta a região (Foto: Elias Ramos - 21/8/2010)[/caption] Crédito das fotos: Elias Ramos e Milton Rocha Pesquisa do acervo fotográfico: Ricardo Lima Fontes técnicas da Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Juventude: Alexandra Ponsá, Nélio Murilo Sanches e Thomaz dos Mares Guia, que compõem a equipe técnica da Diretoria de Políticas de Memória e Patrimônio Cultural Para ver outras matérias da série, clique abaixo: